A música-meme que tomou o Brasil
Descer pra BC foi feita para ser um hit viral. Até comemoração de gol é monetizada. Os creators venceram em 2024. E mais, nesta MargeM 248
Hoje em dia, tudo é conteúdo. Ou seja, tudo é “monetizado”. Até a comemoração de um gol.
Um dos principais jogadores do badalado campeonato inglês de futebol masculino, Cole Palmer, do Chelsea, comemora os gols que faz cruzando os braços sobre o peito com se estivesse se esfregando para se proteger do frio.
O jogador ganhou o apelido Cold Palmer por isso.
Agora Palmer entrou com um pedido para patentear a marca Cold Palmer (e o gesto da comemoração) em diversos setores, de roupas a carros, passando por cosméticos.
Atletas patenteando o próprio nome ou uma marca não é algo exatamente novo. Outros jogadores, como David Beckham e Michael Jordan já trilharam esse caminho. Com uma diferença: se posicionaram como marcas depois de estarem consagrados.
“A decisão de Palmer faz parte de uma mudança cultural mais ampla — e muito mais inteligente — em que os atletas tratam suas marcas pessoais como negócios desde o primeiro dia. Para os jogadores modernos, o jogo é apenas o ponto de partida. O nome, a comemoração e até suas peculiaridades podem se tornar ativos que vão muito além dos 90 minutos em campo. Palmer não é o primeiro a perceber isso, mas talvez seja um dos primeiros atletas da Geração Z a realmente incorporar essa ideia.”
A gente já ouviu bastante sobre “creator economy” e tal, mas foi neste 2024 que os criadores REALMENTE viraram gigantes.
A atenção e a influência que estão abocanhando através de YouTube, TikTok, Instagram, newsletters e podcasts transformaram criadores em empresas de mídia que vendem qualquer tipo de conteúdo.
“Não falamos mais tanto sobre podcasters, músicos, autores ou comentaristas; eles são simplesmente criadores, um termo genérico para pessoas que são famosas por produzir coisas em diversas plataformas. O que os criadores criam, exatamente? Criam conteúdo digital, e não importa muito onde ou de que tipo.
Na era dos criadores, quem você é é mais importante do que o que, exatamente, você faz ou produz, em parte porque o que você produz está sempre mudando, à medida que as plataformas digitais evoluem.”
“Nós vai descer, vai descer/ Descer lá pra BC no finalzim do ano/ Os bombonzim tão bronzeando pra eu chegar e morder.”
Os versos de Descer pra BC estão sendo ouvidos em toda parte. Mas não apenas ouvidos, mas também comentados, analisados, avacalhados. Descer pra BC está na boca do povo porque a música viralizou nas redes.
Não à toa. Descer pra BC é um meme em formato de música.
Cantada pela dupla Brenno e Matheus, em parceria com o DJ Ari SL, Descer pra BC foi pensada, tanto musicalmente quanto visualmente, para gerar buzz nas redes, ser compartilhada. Viralizar.
Não que ela seja um caso à parte – muitas das músicas pop hoje são feitas para viralizar, mas poucas realmente conseguem furar a bolha de seu público alvo. Como um meme.
Descer pra BC é um sertanejo eletrônico com vocal brega romântico (brega, aqui, é o gênero musical). Mas a letra deixa claro que seu público não é apenas quem curte Ana Castela e duplas sertanejas: a canção quer atrair também quem está nos centros urbanos e nos litorais (BC, no caso, é Balneário Camboriú):
“Papai deixou uma herança bem gorda pra mim/ Tem terra pra plantar e pra criar uns gadim/ Mas eu me dei conta que isso não é pra mim/ Prefiro pé na areia do que pé no capim”.
Como muitas faixas de outros gêneros, como trap e funk, a letra é, ainda, meio sacana, lasciva:
“Descer lá pra BC no finalzim do ano/ Os cowboy vai litorando e vai torar você”.
E tem a ostentação: a “bodona de tanque cheio” (bodona é apelido da picape RAM), o papai que deixou herança.
É uma letra curta, para consumo rápido. E para ser falada. E compartilhada. A música não viralizaria se não tivesse um clipe que gerasse imagens virais.
Gravado em Balneário Camboriú, traz os cantores na cidade catarinense, com os pés na areia e dançando junto de algumas criaturas coloridas que lembram uns teletubbies anêmicos.
Musicalmente, achei genérica, com beats que parecem ter sido feitos por IA. O clipe, com essas criaturas na praia, é uma aberração estética. Mas quem sou eu na fila do pedágio pra Camboriú? Até o final da tarde de terça, o vídeo já somava mais de 4,7 milhões de visualizações no YouTube (em 12 dias). Fora as quase 8 milhões de visualizações do clipe que traz apenas a letra.
Cortes com cenas do clipe inundaram as redes na última semana e ajudaram a faixa a chegar ao topo da playlist Top Brasil do Spotify. Na lista Brasil Hot 100, que classifica as músicas mais ouvidas no país, com base nas principais plataformas de streaming, feita pela Billboard Brasil, Descer pra BC está na terceira colocação. Em primeiro, aparece Última Noite, de Léo Foguete.
Dois dos principais hits brasileiros do ano, Descer pra BC é bem diferente de Última Noite.
Esta última é um forró romântico otimista, embalado em um clipe de tom inspirador, com um vocal do tipo bom moço e um clipe bem comportado. Ou seja, música com embalagem tradicional, feita para ser ouvida.
Já Descer pra BC é uma faixa criada para ser compartilhada nas redes, e tudo bem se esse compartilhamento for feito por meio de hate posts: o que interessa pra eles é estar na boca do povo.
Lembra, pelo formato, Old Town Road, a música que fez de Lil Nas X um astro. Como ela estourou? Depois de viralizar no TikTok, com letra e estética que juntavam rap e country.
Em Descer pra BC, a dupla acomoda, em linguagem de meme, sertanejo e eletrônica; romantismo e safadeza; interior do Paraná e Balneário Camboriú (o principal destino em que os brasileiros querem passar o Natal); ostentação e vida na praia.
Mais:
Descer pra BC: hit que pegou top 1 no Brasil foi feito no Paraná e marca carreira de dupla que está na estrada há 10 anos.
Conheça Descer pra BC, hit que ocupa o topo das paradas nas plataformas musicais.
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Excelente a reflexão. Assinado!