Os vídeos de receita, a viralização e a falta de originalidade
Conteúdos que viralizam matam a originalidade? As redes sociais deixaram de ser sociais? A excelente série Cangaço Novo. E o Chic Show e as Sociedades Matriarcais. E mais, nesta MargeM 223
Vídeos de gente preparando receitas de comida tomaram as redes sociais. Se você assistir a um ou dois deles no Instagram ou no TikTok, inevitavelmente será bombardeado com dezenas, centenas de outros. Alguns de chefs estrelados, outros de influencers que se especializaram na linguagem das redes e muitos de cozinheiros informais que querem abocanhar um pedaço do engajamento gerado por esse tipo de conteúdo.
Já estava pra escrever sobre isso aqui na MargeM há um tempo, e esta excelente matéria do NYT sobre essa onda de vídeos de culinária no TikTok resume bem 1) por que esse tipo de conteúdo atrai tanto a nossa atenção e, mais importante, acho, 2) como esse tipo de formato acaba de alastrando e deixando todos os conteúdos que aparecem na timeline mais ou menos iguais.
Esse tipo de conteúdo viraliza basicamente porque tem uma linguagem rápida e divertida, porque adoramos comida e, também, porque "a qualidade de uma receita não importa tanto no TikTok. As pessoas agora querem se conectar com a pessoa por trás da câmera, além da própria receita".
Além disso, os algoritmos do TikTok e do Instagram "não recompensam a originalidade, diversidade ou complexidade. A característica comum das receitas que estão em alta (nas redes) é que são 'de baixo custo e fáceis de executar'. Esse é o dilema de se tornar viral: o denominador comum mais baixo sempre prevalecerá em detrimento da inovação e individualidade".
Um trecho da matéria é especialmente revelador:
"Cozinhar é uma atividade tão pessoal e profundamente humana. No entanto, a evolução dos vídeos de culinária representa uma mudança mais ampla: algoritmos e inteligência artificial estão cada vez mais influenciando comportamentos cotidianos e podem sufocar a criatividade. Isso pode ser desanimador para as próprias pessoas cujos vídeos não conseguimos parar de assistir."
Vale para vídeos de receitas, vale para qualquer conteúdo que viraliza nas redes.
Quantas vezes você já leu que "as redes sociais morreram"? Aqui na MargeM já falamos bastante a respeito. Muito disso é "culpa" do TikTok, que se apresenta mais como uma plataforma de distribuição de vídeo do que como uma rede social para curtir amigos.
Mas o fato é que as redes sociais guiam hábitos e comportamentos. Há uma tendência, percebida principalmente entre usuários mais jovens: o aumento na utilização de canais privados e grupos fechados.
"O cansaço que as pessoas sentem quando se trata de postar no Instagram levou mais usuários a postagens privadas e grupos fechados. Recursos como Close Friends e o aumento dos bate-papos em grupo oferecem às pessoas um lugar mais seguro para compartilhar memes, fofocar com amigos e até mesmo conhecer novas pessoas."
É uma tendência que vem crescendo. As pessoas estão passando mais tempo no Instagram e em outras redes mandando DMs, enviando fotos em grupos fechados, usando o Stories e o Close Friends.
A reportagem crava: saímos de uma mídia social para uma mídia social.
"À medida que um número crescente de pessoas se depara com as consequências do compartilhamento constante, as mídias sociais se tornaram menos sociais e mais mídia — uma constelação de plataformas de entretenimento em que os usuários consomem conteúdo, mas raramente, ou quase nunca, criam o seu próprio. Influenciadores, profissionais de marketing, usuários comuns e até mesmo executivos de mídias sociais concordam: o conceito de mídias sociais, tal como o conhecíamos, morreu."
Um desempregado sai de São Paulo em direção ao sertão do Ceará para tentar receber algumas terras como herança. Chegando lá, reencontra as duas irmãs e envolve-se com uma gangue de cangaceiros que promove assaltos a bancos da região.
Assim começa Cangaço Novo, série criada por Mariana Bardan e Eduardo Melo, com direção de Aly Muritiba e Fábio Mendonça. É um dos principais lançamentos do ano da Prime Video.
A recente safra brasileira de séries ficcionais deu ótimos frutos (Os Outros, Manhãs de Setembro são dois exemplos). Com edição esperta, diálogos que nos colocam no meio do sertão, cenas de ação bem construídas e uma história que se desenvolve com tensão e emoção, Cangaço Novo é a melhor série ficcional brasileira que vi em muito tempo.
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Estadão/UOL: “Cangaço Novo vira hit no mundo”.
Omelete: “Cangaço Novo traz ação de aspiração hollywoodiana para o sertão nordestino”.
Cinema com Rapadura: "Espetáculo violento, autêntico e muito valente".
Se as séries ficcionais estão em alta, os docs brasileiros não ficam atrás. Dois deles:
Chic Show - filme que radiografa o lendário baile de soul e funk que animava o salão do Palmeiras nos anos 70 e 80. Entrou no cardápio do Globoplay.
Sociedades Matriarcais - minissérie em seis episódios que mergulha em quatro desse tipo de sociedade: Minangkabau (na Indonésia), Bijagós (Guiné Bissau), Bribri (Costa Rica) e Khasi (Índia). Os três primeiro episódios estão no Globoplay.
A HYBE, produtora gigante do K-pop (responsável por grupos como BTS), e a gravadora Geffen se uniram para montar um grupo feminino.
Todos os bastidores serão transmitidos, como um reality show, no YouTube. O primeiro episódio estreia nesta sexta (1 de setembro). Depois, a Netflix exibirá um doc sobre a banda.
Entre as 20 candidatas a integrar o grupo, uma é do Brasil.
As imagens desta newsletter são de Emily Lipson, talentosa fotógrafa que captura de celebridades a jovens que frequentam clubes, em imagens com textura e cor que remetem à fotografia analógica. Uma entrevista com ela.
→ Tênis antigos estão na moda e levantando as vendas de marcas como Nike, New Balance e Adidas. ("Esse fenômeno é atribuído por especialistas a causas como nostalgia, impacto do hip-hop, estratégias empresariais avessas ao risco e uma obsessão cultural pela reciclagem da propriedade intelectual.")
→ Excelente reportagem em texto e fotos sobre um dia na vida de quem trabalha em uma das maiores dark kitchens de São Paulo.
→ "Por que os filmes estão tãããão longos?"
→ Porta dos Fundos inaugura canal no Kwai em parceria inédita.
→ A Netflix lançou outra produção "interativa": na comédia romântica As Escolhas do Amor, o espectador pode escolher o destino da personagem principal, que tem três caras atrás dela. (Tudo bem que tem o lance interativo, mas a história – ou as histórias – poderia(m) ser menos clichê(s).)
→ A OpenAI deve chegar a US$ 1 bilhão em receitas impulsionada pelo ChatGPT.
→ CEO do Bumble: "IA pode ser solução para os tímidos e os que não sabem conversar".
→ O Instagram deve permitir Reels de até 10 minutos para competir com TikTok.
→ Mark Thompson, um dos responsáveis pela enorme e lucrativa transformação digital do NYT, é o novo CEO da CNN.
→ O problema com as avaliações de serviços online. ("A raiz do problema é que um pedido de feedback não é realmente um pedido de feedback; é um meio de acumular dados de um determinado tipo, para uma finalidade presumida.")
→ Farmácias estão vendendo 15 anos de dados seus para você receber anúncios.
→ Uma música para cada minuto do dia.
Salve Thiago! Adoro o trabalho que fazem :)
Ja viram o podcast sobre newsletters que lançamos? https://open.spotify.com/show/1fJRrPxDT7tAWn4wCMUr2w?si=b6b269dbc20340de
Acompanho vídeos de cozinheiros italianos (fatti in Italia) tanto no YT quanto via Twitter, chamando links externos, e sinceramente não consigo perceber essa banalização. Os vídeos que assisto são longos (na comparação), duram de 5 a 10 minutos.
TikTok? Não é um app que representa a humanidade, nem deve ser tomado como trendsetter. Eu próprio não sou um trendsetter. De verdade, acredito na diversidade da experiência humana, e sei que a imprensa ama buscar, criar ou nomear tendências e decretar que são unânimes ou inexoráveis.