Ted Chiang: "Usar ChatGPT me faria sentir cúmplice de um crime"
Um dos mais celebrados autores de ficção científica fala com a MargeM sobre por que as IAs nunca conseguirão fazer arte
Esta MargeM #267 vem bem recheada. Porque não é todo dia que a gente tem a oportunidade de entrevistar alguém como Ted Chiang. Ele está em São Paulo para ministrar a palestra “Como a IA transforma linguagem e storytelling”, organizada pela agência de comunicação Pina. Os ingressos já estão esgotados.
Além desta newsletter, a plataforma de conteúdo MargeM está no Instagram e no Spotify, onde tem uma playlist nova e deliciosa para você ouvir.
Ele já ganhou alguns dos principais prêmios da literatura de ficção científica, como o Nebula, o Hugo e o Locus, e também foi reverenciado no PEN/Malamud pela excelência de seus contos.
Com apenas duas coletâneas de contos publicadas, ambas editadas no Brasil pela Intrínseca, Ted Chiang tornou-se um dos mais celebrados autores de ficção científica do mundo.
Fiz uma entrevista com ele no sábado (dia 2), em um hotel em São Paulo. O papo teve bastante coisa sobre inteligência artificial, já que é um tema caro a Chiang e ele veio a SP justamente para falar sobre isso – na palestra “Como a IA transforma linguagem e storytelling”, organizada pela agência de comunicação Pina. (Ingressos já estão esgotados.)
Abaixo, separei alguns trechos da entrevista, que foi publicada na íntegra pela Folha.
Sobre não usar IA para escrever:
“Por dois motivos. O primeiro é que, bem, às vezes me descrevo como um ‘vegano de LLM’ [sigla em inglês para grandes modelos de linguagem]. Não uso LLMs, como o ChatGPT, por princípio, devido ao enorme custo ambiental, da exploração da mão de obra e porque esses modelos são construídos com base no roubo de propriedade intelectual. Usar o ChatGPT me faria sentir cúmplice de um crime, da mesma forma que os muitos veganos se sentem ao comer carne.”
“Mas, se, hipoteticamente, houvesse um LLM eficiente energeticamente, socialmente ético a ponto de os trabalhadores serem bem tratados e se esses LLMs fossem treinados apenas com trabalhos em domínio público, ainda assim eu não usaria. Escrever é uma forma de entender o que estou pensando, e não quero usar uma ferramenta digital para fazer isso por mim. Não vejo como ela poderia me ajudar, porque se quero entender os meus pensamentos, preciso descobrir o que estou pensando.”
Sobre por que IAs não conseguirão fazer arte:
“Algumas pessoas diriam que a pintura é uma forma de os humanos se conectarem. Música é uma forma de conexão. Ficção literária é uma forma de conexão. A IA não pode fazer esse trabalho, porque não há conexão. Se você assiste a um filme para conhecer a visão de mundo de um cineasta, não terá isso numa produção gerada por IA. Se você observa uma pintura e entende a visão de mundo de um artista, certamente não verá isso numa imagem gerada por IA. Então depende do que achamos que é o propósito de filmes, pinturas, música ou literatura.”
Sobre por que as IAs entrarão no mercado de filmes:
“Fazer filmes é caro e trabalhoso. Para alguém entrar dentro do negócio do cinema, tem de encarar muitas barreiras. Se você tem uma ideia para um filme, provavelmente precisará de muito dinheiro para criá-lo. Para fazer arte visual ou música, não precisamos de tanto dinheiro, e para literatura menos ainda. São diferentes meios, com diferentes tipos de barreiras para acessá-los. O impacto das IAs será maior em um meio como o cinema, porque é onde as barreiras são mais altas.”
A matéria completa tá no site da Folha, e ali também dá para ver quais são os dois recentes livros que Ted Chiang recomenda.
Na Noruega, tem rede de supermercados que implementou o “preço dinâmico” nos produtos. O custo para comprar uma dúzia de ovos, por exemplo, pode diminuir (ou aumentar) dezenas de vezes ao dia, dependendo da demanda e da concorrência.
“Como a Beast Philanthropy está transformando a bondade em um fenômeno viral” é o título desta reportagem da Forbes. O texto detalha como a estratégia de conectar conteúdos atraentes a causas importantes pode gerar bom dinheiro que são repassados a instituições de caridade.
“Filmes tradicionais de caridade geralmente oscilam entre dois extremos: uma seriedade que entedia ou um sensacionalismo que explora. (...) A equipe da Beast Philanthropy busca o ponto ideal em que entretenimento, inspiração e impacto se cruzam – um conteúdo que você quer assistir e se sente compelido a compartilhar. (...) 100% da receita de anúncios, patrocínios de marcas e lucros com merchandising vai diretamente para as instituições.”
Dois pontos.
1- É ótimo que projetos voltados à filantropia consigam criar ações que efetivamente gerem engajamento e dinheiro e/ou serviços para instituições que dependem de doações. Não fica só no discurso, o resultado é real.
2- Mas… a filantropia realmente funciona? Precisamos mesmo dela? Há muita gente que é contra:
A matemática impossível da filantropia.
O mundo estaria melhor sem filantropos?
Viu algum dos três shows que o Nicolas Jaar fez no Brasil? Um dos principais produtores de eletrônica do mundo, o chileno-americano veio como atração do núcleo Gop Tun.
A mesma Gop Tun fez, em parceria com o pessoal da Balearic Banana uma noite em Berlim que teve como convidado o brasieiro Millos Kaiser. E o set dele acabou de chegar ao Soundcloud. Ele está aqui e a MargeM, que já ouviu algumas vezes, recomenda muito.
🍺 250 mil 🍺
Este acima foi o número de pints de cerveja bebidos pelos fãs do Oasis em um único show em Wembley, em Londres. Um recorde para o estádio. Como comparação: em um apresentação do Coldplay no mesmo local foram vendidos 120 mil pints.
“Ele me pediu para virar o Cézanne. Tirei-o da parede, o virei e, lá no verso da tela, estava impresso um pequeno carimbo redondo. Tinha três elementos – o ano de 1943, uma águia e duas letras, em uma fonte estilizada que as fazia parecer relâmpagos: SS.
Olhei para o Jimmy. Ele apenas assentiu, com um olhar tão culpado e envergonhado que pensei que começaria a chorar. Olhei de novo. Não havia dúvida. Era o carimbo da SS, a Schutzstaffel nazista. Tinha sido colocado ali por um membro do Terceiro Reich. Senti tontura. Esse era o problema do Jimmy.
Tentei tranquilizá-lo. ‘Está tudo bem. Sempre há uma resposta’. Mas isso não melhorou seu ânimo. ‘Vire o Van Gogh’, ele me disse. Eu virei, e lá estava outro SS.”
As imagens desta newsletter estão na expo Beside The Sea: Photographs by JJ Waller and Martin Parr.
→ Quer aprender como o Substack funciona? ) O curso Substack 101 é uma aula de duas horas “com tudo o que você precisa saber para usar melhor a plataforma”. Será em 7 de agosto, via Zoom. Inscrições no link acima.
→ Ao apostar no alcance dos jornalistas influencers, a Fox saiu na frente em relação às outras emissoras de TV.
→ Os influencers e o boxe: “É competição ou entretenimento? Atrai um novo público para um esporte que tenta se manter relevante? Ou acaba tirando espaço das lutas de verdade?”.
→ A Amazon colocou dinheiro em uma plataforma de streaming que permite aos usuários criar séries de TV usando IA.
→ Nos EUA, podcasters de opiniões controversas estão sendo procurados por emissoras de TV.
→ A Deezer está com apenas 9 milhões de assinantes no mundo. Em 2018, eram 14 milhões.
→ Globo cria novo canal no YouTube para concorrer com a CazéTV.
→ Jeremy Strong interpretando Mark Zuckerberg em A Rede Social 2?
→ Como Halle Berry se tornou o novo rosto da menopausa.
→ Delivery Instantâneo: Estão tentando achar um jeito de fazer entregas em até 15 minutos.
Ótimo contraponto do Ted Chiang no mar de otimismo que vemos sobre IA. E parabéns pela ótima newsletter!