MovieTok x crítica tradicional de cinema
Como influencers estão ganhando seguidores (e grana) fazendo vídeos sobre filmes no TikTok; a ótima série Black Bird; continua a festa dos 50 anos do hip-hop; o fenômeno Podpah; e mais, na Margem 221
Há os velhos críticos de cinema. E há os influencers (ou críticos) de cinema do TikTok.
Já falamos aqui na MargeM sobre o BookTok, o círculo de recomendação de livros no TikTok que é capaz de fazer uma obra virar best-seller. O mesmo pode-se dizer do MovieTok.
São “personalidades no TikTok que alcançam milhões de pessoas ao fazer análises, comentários e promoção de filmes. Várias delas ganham o suficiente na plataforma (...) para transformar sua paixão pelo cinema em um trabalho em tempo integral”, reporta o New York Times.
Achei particularmente curioso como uma dessas personalidades enxerga o trabalho de um crítico de cinema “tradicional”:
“Quando você lê o texto de um crítico, parece quase como se um computador a tivesse escrito. Mas quando você tem alguém no TikTok que você assiste todos os dias e conhece a voz dele e o que ele gosta, há algo pessoal ao qual as pessoas podem se conectar.”
Há, para esses influencers, uma desconexão entre críticos e o resto do mundo.
“Muitos de nós não confiamos nos críticos. Eles assistem a filmes apenas procurando algo para criticar. Os fãs assistem a filmes em busca de entretenimento.”
Por essa cobertura, digamos, menos crítica, essas personalidades ganham vantagens dos estúdios. A Warner Bros. convidou dezenas de influencers do circuito MovieTok para assistir a Barbie antes dos outros profissionais.
A percepção que os TikTokers têm dos críticos tradicionais não se restringe ao campo do cinema. E tem muito a ver não apenas com a relação do fã com a arte (cinema, música etc.), mas também com a relação entre fã e artista (o fandom).
Láááá em abril de 2022, escrevemos aqui na MargeM: “Como diz um pesquisador sobre os fãs nos tempos atuais, 'eles foram de um público supostamente divergente e excêntrico para a principal audiência, foco dos marqueteiros, fonte de trabalho voluntário para promover marcas e até mesmo um lugar de onde a nova geração de profissionais criativos pode emergir’”.
Voltando ao MovieTok, alguns dados que aparecem na reportagem são superlativos: um dos influencers conta que um vídeo curto que ele fez, sem muito trabalho, teve mais de 200 mil visualizações em menos de uma hora. E, para fazer um post patrocinado por um estúdio ou plataforma de streaming, eles cobram entre US$ 1 mil e US$ 30 mil.
A reportagem do NYT repercutiu bem:
A GQ publicou o artigo “ MovieTok não é contracultural, é a morte da crítica de cinema”.
Já a i-D foi por outro caminho: “Em defesa do MovieTok”.
⤵
Para completar o tema, o NYT publicou uma lista com “8 TikTokers que estão redefinindo a crítica de filmes”.
Falamos na MargeM passada: a Apple TV está numa fase ótima de séries. Drops of God, Hijack, Silo, Slow Horses, Black Bird e várias outras. Mas a questão agora é: quem está assistindo realmente a Apple TV?
Um dado importante: segundo uma estimativa, a Apple TV teria cerca de 29 milhões de assinantes (em 2022). A Netflix, por exemplo, tem 274 milhões. A HBO Max, 123 milhões. A Prime Video, 184 milhões.
Bem, eu estou vendo séries da Apple TV. Gostei bastante de Black Bird, criada pelo Dennis Lehane (o escritor de Sobre Meninos e Lobos, entre outros). Em seis capítulos, é inspirada em uma história real: Jimmy Keane é detido com drogas e armas e pega 10 anos de prisão. Mas o FBI e a promotoria oferecem um acordo: há um serial killer na cadeia que pode ser solto porque a polícia não encontrou mais provas; se Jimmy conseguir que o serial killer confesse outros crimes, sua pena será anulada.
▶ A ótima banda escocesa Mogwai fez a trilha da série. Dá pra ouvir aqui.
O hip-hop chegou aos 50 anos.
Na MargeM passada, escrevi sobre um material excelente do New York Times, em que Mahogany L. Browne, o primeiro poeta residente do Lincoln Center, montou uma espécie de “carta de amor” ao rap usando trechos de letras de nomes como Jay-Z, Missy Elliott, Wu-Tang Clan, Nas e muitos e muitos outros. Só esqueci de um detalhe: o link pro material. Agora vai.
Ainda sobre o cinquentenário desta arte que continua se transformando e inovando (nas letras, na produção musical, na estética, na postura inconformista):
50 artistas do hip-hop falam sobre 50 músicas que adoram. (Como o material do NYT, este é um espetáculo. Uma delícia se perder lendo os textos e ouvindo faixas clássicas).
O futuro do rap é feminino: “À medida que seus colegas masculinos se tornam depressivos e paranóicos, são as mulheres que estão se divertindo”.
E duas boas entrevistas com o KL Jay:
▶ Ponte Jornalismo: “Hip-hop é um fenômeno espiritual que veio para mudar o mundo”.
▶ Folha: “Perdemos dinheiro, mas ficamos robustos, grandiosos”.
Quando o assunto é popularidade de podcasts, temos um oceano formado por aqueles com baixíssima audiência; uma baía da Guanabara com aqueles que conseguem alcançar números entre médios e bons; as exceções, que são consumidas por milhões, formam uma pequena poça d’água.
Entre esses últimos, está o Podpah, de Igor Cavalari (o Igão, 27 anos) e Thiago Marques (Mítico, 33). A dupla já abocanhou, apenas no canal no YouTube, mais de 2 bilhões de visualizações e, só no primeiro semestre de 2023, faturou mais de R$ 18 milhões.
É um fenômeno. Eles lançaram mais um podcast (com Pedro Scooby) e, nesta entrevista, falam um pouco sobre como chegaram onde estão. Dois trechos:
“Somos dois moleques comuns que não gostam de confrontar ninguém. A maioria das intimidades que os convidados falam partiu deles, tomam uma cerveja e ficam à vontade.”
“Quando o convidado chega e vemos que ele está tenso, nós vamos cumprimentá-lo e falamos, olho no olho, que não queremos saber da polêmica dele e que cagamos para quem ele namora. Eu sinto que a pessoa vai se desarmando. Muitos esquecem até que está filmando.”
“Você é a mesma pessoa que costumava ser?”.
A frase acima está neste longo, mas ótimo artigo (em inglês) em que o autor tenta entender se e como mudamos com o passar do tempo.
“Tente lembrar a vida como você a viveu anos atrás, em um dia típico no outono. Naquela época, você se importava profundamente com certas coisas (uma namorada? Depeche Mode?), mas era alheio a outras (seus compromissos políticos? seus filhos?). Certos eventos importantes - faculdade? guerra? casamento? Alcoólicos Anônimos? - ainda não tinham acontecido. O eu que você lembra parece ser você mesmo ou parece um estranho? Você parece estar lembrando de um passado recente ou lendo um romance sobre um personagem fictício?”
As imagens desta newsletter são de Janette Beckman, fotógrafa que clicou diversos nomes ligados ao hip-hop desde os anos 1980, nos EUA.
→ “Ainda é um pouco cedo para classificar o Threads como um desastre, mas ele está claramente perdendo usuários e não está conseguindo ganhar tração significativa nas mídias sociais.”
→ ”Como é usar o Artifact, o novo app dos criadores do Instagram.”
→ Pesquisa no Reino Unido mostra que 34% dos jovens entre 14 e 25 anos descobrem livros por meio do YouTube. 32% disseram que acham as dicas no TikTok.
→ As 50 melhores trilhas do cinema. (Spoiler: Purple Rain aparece em segundo.)
→ Boa esta entrevista com o Michael Imperioli (o Christopher Moltisanti de Sopranos), em que o ator fala bastante sobre música (ele adora My Bloody Valentine, Smiths, Lou Reed, Patti Smith).
→ A segunda temporada de The Bear é excelente, e a cena em que uma chef prepara uma omelete é um exemplo de como a série "trata a comida como um ato de amor".
→ Como o "fetiche por asiáticos afeta mulheres e homens amarelos, e de que maneira o k-pop impactou esse cenário".
→ O escritor e músico John Robb escreve sobre como Mick Jagger e Keith Richards lidam de maneira diferente com o envelhecimento.
→ Google Maps ou Apple Maps? Segundo este artigo, o segundo está ganhando do primeiro.
adorei a edição e as imagens que usou <3
talvez por eu gostar de ler ouvindo música, entendo zero essa febre em podcasts rsrs
fiquei curiosa sobre black bird, vou assistir.
sobre lista de trilhas, senti falta da trilha de Matrix entre as 50 da pitchfork :(
Poxa, obrigado por incluir a pauta do Artifact :) Mais uma edição muito bacana, parabéns, meu caro!